segunda-feira, novembro 12, 2007

Ficção científica

Estava há dias a ouvir umas aulas do MIT sobre neurobiologia e comportamento, onde foi dito que a ideia cartesiana do corpo como uma maquina atrasou toda a pesquisa feita na área e a compreensão que tínhamos destes mecanismos, quando me pus a pensar na ficção científica na cultura popular, principalmente do tema que retrata a subida da máquinas e a subsequente conclusão da imperfeição da humanidade e da sua perseguição. Sempre reduzi este género de ficção a uma reacção à invasão da tecnologia da vida moderna e a ideias anacrónicas de um "passado de ouro" em que tudo era mais simples porque a tecnologia cria tantos problemas como os que resolve, mas algo mudou.


A evolução tecnológica é uma consequência da evolução do mercado, baseando-se nela e, ao mesmo tempo, reforçando-a. Com a reestruturação da sociedade moderna em função do capital, em vez do social, a tecnologia invadiu todos os campos da nossa vida, não num sentido de controlo, mas com pressupostos industriais mecanicistas (como a produtividade) aplicados à vida privada. Quando a ficção científica explora a subida das maquinas ao poder, mais do que uma reacção à tecnologia em si, explora estes pressupostos a que estamos reduzidos, recusando-os e buscando valores que "transcendam" esses conceitos mecanicistas e que possam definir a humanidade de maneira diferente. Infelizmente muitos desses valores são baseados na religião ou na filosofia que são baseados por sua vez na negação do corpo que tão bem define a sociedade ocidental.


O grande sucesso desse grande desastre cinematográfico dos irmãos Wachowski - "The Matrix" - parece-me basear-se exactamente nesse ponto: na frustração que quase todos sentimos com a vida moderna e a mecanização (quer pela tecnologia, quer pela razão) de algo que sentimos ser irredutível, mas contra a qual não temos noções de como reagir sem cair no histerismo ou sem buscar um significado oculto que possa adicionar sentido à nossa vida (o que no último filme da trilogia assume uma iconografia super-carregada extraída de várias origens, mas sem sentido retirada dos seus contextos originais). Este último ponto também é responsável pelo sucesso d'"O Código Da Vinci" e dos seus sucedâneos, todos construídos sobre uma agenda sócio-política que os torna bastante enfadonhos e banais.

Sulcos

A ouvir: Editors - Bones

Pegando no conceito de Einstein de que o espaço não é curvo por causa das massas dos corpos celestes, mas que estas massas ocupam aqueles lugares por causa daquelas curvas e na aplicação psicanalítica deste conceito de Žižek, não será possível aplicar o conceito a outras áreas como a sociologia, psicologia, filosofia, teoria da cultura, etc.?
Não seria, então, possível descobrir padrões relevantes resultantes de constantes físicas/biológicas/químicas, sócio-culturais, geográficas, históricas, etc.?

A conjugação de determinados parâmetros iria criar a abertura para surgir determinado tipo de resposta (não a resposta em si, porque essa seria sempre contextual). A ideia de que determinados conceitos/invenções são independentes da história ou génio de uma pessoa, mas surgem devido a factores histórico-sociais que a facilitam (quase que a provocam), não parece indicar mesmo nesse sentido?

Assim, características pessoais seriam de encontrar mais facilmente em determinados contextos e a origem dos estereótipos seria apenas a abstracção e generalização de essas experiências.
Por outro lado, se é assim que aprendemos, será que não encontramos essa estrutura porque é assim que apreendemos a realidade?
Não só estamos limitados na nossa percepção da realidade (para não dizer impedidos de o fazer), como a maneira como o fazemos (de)forma a experiência.

quinta-feira, novembro 01, 2007

Anti-Social Networking

Sempre senti algum descontentamento com os sites de social networking como o hi5, mas nunca o consegui formalizar. Esta sensação fez com que, há já alguns anos, tenha apagado todas as contas deste tipo (pelo menos as que me lembrava, já que a maioria das contas que abri, fi-lo em resposta ao convite de alguém e já nem sem bem quantas foram). Há algumas semanas estava a ler um livro e deparei com uma frase do William James que sugere, em 1890, que uma pessoa tem tantos egos-sociais quantos indivíduos conhece ("a man has as many social selves as there are individuals who recognize him and carry an image of him in their mind"). Fez-se luz. De facto, o que sempre me incomodou foi o nível de exposição a pessoas diferentes, de contextos diferentes e a classificação de todos como "amigos". Incomodava-me que aquela pessoa que mal conheço e com quem mal falo no emprego tenha uma visão de como foram as minhas ferias ou os excessos do fim-de-semana passado, apesar de querer partilhar essas recordações com a família ou amigos. Ou que aquela pessoa que me foi apresentada na outra noite e com quem não me dei muito bem (sou, já me disseram varias vezes, arrogante e intolerante), mas que sentiu que, depois disso, sou o seu melhor amigo e que me tem de incluir no seu grupo de amigos de um destes sites.

Acho que a solução seriam perfis ou níveis: haveria um nível muito básico de apresentação (não muito mais do que foto e nome) e a esse nível poderiam ser atribuídos um ou vários perfis. Já sei que muitos destes sites permitem definir algumas zonas como "privadas", mas isso quer dizer que todos os "amigos" as conseguem ver. Pegando no exemplo das fotografias dos excessos do fim-de-semana, podia ter interesse em partilha-las com alguns amigos, mas que a família não a visse. Imaginando que vou a uma reunião de determinado grupo (uma LAN ou algo semelhante) essas fotos poderiam ser completamente indiferentes às pessoas que não participaram nela.
O que proponho é a criação deste níveis, como "família", "emprego", "amigo", "conhecido", e a possibilidade de os combinar: um amigo no emprego teria esses dois perfis, um primo distante podia ser só "família", mas um mais próximo podia também ser "amigo", com acessos a diferentes informações. O que proponho é a esquizofrenizaçao e hierarquização dos nossos egos virtuais e das nossas relações, à semelhança do que acontece na realidade. Admitir que somos pessoas diferentes em contextos diferentes e até explora-lo... parece-me que seria um exercício melhor de auto-conhecimento e definição do que criar personas unidimensionais com as quais nem sempre nos identificamos.